8 de abril de 2010

noiva triste

Iara vai casar.
Era uma vez dois colegas de escola. Aos dezessete, já haviam trocado aneizinhos de plaquê ao som de rimas fáceis, calafrios, fura o dedo, faz um pacto comigo. Talvez seja uma pena que nos tornemos tão pragmáticos, mas a verdade é que, salvo alguns iluminados que já nascem com a vocação brilhando forte em suas testas, ninguém dessa idade sabe o que vai fazer com o resto de sua vida. Você sabia? Te invejo.
Nove anos depois, Iara vai casar. Flores, fitas e babados flutuam pelos ares dando o tom da ocasião enquanto mulheres estabanadas se alvoroçam em torno dela, tirando uma provinha do momento mágico alheio - afinal, casar é a coisa mais feminina que existe. A alegria reina sobre todas, exceto a protagonista. Iara está infeliz. E noiva triste é uma afronta.
Iara não faz segredo de que não gosta mais do noivo. Seu idiota, você não serve pra nada, mesmo! Mãe, cancela o buffet que não vai mais ter casamento! Vovó, devolve os presentes! Ao telefone e aos berros, ela diariamente segue o ritual de terminar tudo com ele. Já reparou que tem pessoas que só se relacionam brigando? Talvez você nunca tenha tido o azar de passar um feriado prolongado num sítio convivendo com gente assim, mas já deve ter notado que alguns casais são viciados em discutir em público. Estão sempre irritados um com o outro: tudo o que ela faz o deixa truculento, enquanto tudo o que ele diz a faz revirar os olhos com aquela expressão de affffff. Vivem trocando acusações que começam com “você sempre”, prontamente respondidas com “mas e você que nunca”. Acreditando que todas as atitudes do outro tem a intenção de lhes atingir, eles acham que o importante é ganhar a discussão, mesmo que isso signifique nunca resolver o problema que a gerou. Recentemente li Fernanda Young lamentar que é uma pena que os ouvidos não tenham pálpebras e lembro disso com frequência.Se ela se enrosca em outro cara ou se é tudo paranoia dele, não tem importância nenhuma; se o noivo é um babaca mesmo, não é o que faz a diferença, porque eles não estão se importando se isso vai terminar em divórcio ou no Linha Direta: vão casar mesmo assim. Encontrar um culpado é irrelevante quando se trata de dois adultos que não se entendem - dá nos nervos, e o ponto nevrálgico da questão é justamente esse: chega.
A relação se desgastou. Não confio em você. O amor acabou. Não superou uma traição. Não é amor. Você não é quem eu queria que você fosse. Usar o parceiro como bode expiatório é dar um tiro no próprio pé, pois se seu companheiro ficar infeliz, ele não será capaz de cuidar de você. Claro que todo mundo passa por fases turbulentas e é de se esperar que aqueles que estão por perto acabem pagando o pato; aliás, é isso mesmo que esperamos: queremos dividir o peso, ajudar a carregar, tornar a vida do outro mais leve - cuidar. Hoje estou em um relacionamento alegre e não penso em sair dele, mas se monstros como desconfiança, discussão e desrespeito povoassem o dia a dia desse convívio, eu optaria por seguir sozinha. Se existe alternativa, por que é que alguém preferiria se relacionar de forma concretamente doentia a uma vida solteira e potencialmente feliz?Gente, a Iara vai casar com um cara que ela detesta e eu não consigo entender. Cartas para a redação, por favor.