31 de março de 2008

o tempo certo ou a dor de barriga

Se eu comer uvas verdes, terei dor de barriga. Se elas estiverem maduras demais, também. Há o período de plantio e o período de colheita, isso todo mundo sabe. É popularmente sabido que a gente colhe o que planta, mas o que a sabedoria popular não ensina é a respeito da hora certa de semear e, principalmente, o tempo exato de colher esses benditos frutos. Suponhamos que você já tenha feito sua semeadura. Escolheu as melhores sementes, depositou-as no solo adequado e agora... vai ter que esperar! Há muito trabalho a fazer enquanto elas crescem. Só que você está com fome agora, ora bolas. A sabedoria popular – sim, ela de novo - previu isso também, e faz um alerta: quem espera sempre alcança. Conheço uma mulher cuja natureza é nômade. Viajava muito e de carona. Para sustentar a paixão por viagens, fazia bicos: garçonete em bares, recepcionista em eventos e o que mais aparecesse. Não queria emprego fixo de jeito nenhum, com medo de que esse compromisso tolhesse sua prezada liberdade. Como resultado dessa escolha, não conseguia concluir a faculdade. Um projeto adiado que, com o correr do tempo, passou a exigir dela o respeito que os sonhos merecem. Algumas estações se passaram desconfortáveis – coisa de quem anda comendo uvas verdes. A culpa por viver de uma forma apaixonada, mas que não permitia a construção de nada durável, começou a pesar. Então ela fez uma nova escolha: voltou a morar com a família, arranjou um emprego e foi estudar. Era o início da espera pela maturação. Seus frutos já estavam plantados. Pensando nisso, lembrei-me de uma frase que aprendi há alguns anos no Manual do Guerreiro da Luz. De tempos em tempos, ela torna a me perseguir. É mais ou menos assim: em seu caminho livremente escolhido, tem que acordar cedo, conviver com pessoas de quem não gosta muito, submeter-se a regulamentos. Por que é que alguém escolheria livremente um caminho desses? Por que tem objetivo, fé, meta, chame como quiser. Mas isso é coisa de quem conhece algo sobre a hora certa de ceifar. A mulher de quem falei não passou a ter uma vidinha burocrática por falta de opção. Nada contra as vidinhas burocráticas, necessárias que são, mas isso não é de sua natureza. Embora ela sentisse que não estava exatamente onde gostaria, sabia que estava a caminho e perseverou. Dando um passo de cada vez, sem perder de vista o lugar onde desejava chegar. Tomou o cuidado de não permitir que as uvas passassem da época, aprisionando-lhe em uma vida que não desejava para si - como a Martha Medeiros disse, há pessoas que se tornam escravas daquilo que construíram. E isso também é um risco - Enquanto esperava pela época da colheita, dedicou-se a aperfeiçoar suas técnicas e aprender a paciência. Sim, paciência se aprende. Hoje ela está de mudança para sua pousada à beira-mar. Livre-arbítrio e disciplina. Combinação assombrosa de poderes. Não dá para ter tudo o que queremos ao mesmo tempo, aqui e agora, não é mesmo? Todo santo dia somos obrigados a fazer escolhas e a abrir mão daquilo que nos fará menos falta (pelo menos por enquanto). Sabe o amigo-mala? É aquele que, em todas as viagens da turma, deixou de conhecer cachoeiras paradisíacas e lindas praias desertas por pura preguiça de enfrentar a trilha sem asfalto e conforto. Aquele que, por falta de determinação, perdeu toda a recompensa. Deixar de seguir uma estrada só por que que está longe de ser sua favorita, mas que, se você enfrentasse, o conduziria a um lugar com vista incrível, é muito mais que falta de coragem, é burrice.
Pessoal, vou contar uma coisa que precisa deixar de ser segredo: existe uma minoria cônscia de que é impossível não viver de acordo com suas escolhas. Pare de reclamar e join us.

7 de março de 2008

mulheres vermelhas

Sabe aquela história das maçãs do topo? É uma que versa a respeito das melhores mulheres, comparando-as aos frutos que estão no topo das macieiras que, por sua vez, são os mais saborosos, mais vermelhos e blábláblá. Por estarem tão acima das outras e, por esse mesmo motivo, serem as mais difíceis de alcançar, as pobres maçãzinhas ficam lá em cima se perguntando que diabos poderia estar errado com elas, já que ninguém as colhe. E o batalhão de mulheres-maravilha se pergunta o mesmo, já que ninguém as come. Penso eu que, na demora do atrevido apanhador que Machado de Assis propõe, as frutas terminarão apodrecendo, caindo no chão e - adivinha? – virando adubo. O que me traz a uma conclusão óbvia: ser maçã do topo é uma tremenda roubada, menina. As melhores ficam chupando o dedo. E só o dedo, entenda bem. Sua inteligência é tão expoente, sua beleza tão desconcertante e sua trepada, tão sacana. Possui presença de espírito, uma carreira legal e IMC 20. Você é tão boa, mas tão boa que casar com você é quase inevitável. Mas não é inadiável, por isso espere, pois apesar de ele não confessar isso nem sob tortura chinesa, só deseja reencontrá-la dentro de alguns anos, uma vez que precisa se preparar para ter tal prodígio ao seu lado. Não, garotas, aquela lorota do “boa demais para mim” jamais é dita a uma vermelha legítima. No caso de ser verdade, homem algum admitiria uma coisa dessas. Essa é a desculpa que as caídas recebem. Pura compaixão. Com vocês, vermelhas, é competição. Casamento é o menor dos problemas das moradoras de copa de árvore. O pior acontece quando o cavaleiro andante sente-se de tal forma intimidado que, quando finalmente vão para a cama, o cara fica tão nervoso que termina se encolhendo ante tal magnitude. Atenção, garotas, ser maçã do topo não é negócio! Guardem seus poderosos predicados para algumas poucas (e boas) amigas. Homens admiram mulheres espertas, é verdade. As maçãs do topo são solenemente reverenciadas. Mas é como naquela fábula que narra uma conversa entre a rosa e a couve-flor: de que adianta ser linda e cheirosa se ninguém te come? O preço que se paga às vezes é alto demais, Humberto canta pra mim enquanto reflito sobre o que seria necessário para ser uma frutinha qualquer. Daquelas que qualquer um consegue coligir, morder, fazer torta. A serpente apóia a iniciativa: quanto mais maçãs mordidas, melhor. Por que motivo preocupar-se com o fato de elas estarem ao alcance de todos, desde que não seja preciso fazer o esforço de escalar, correr o risco de cair? Ah, a queda. A velocidade terrível da queda. O verdadeiro pesadelo do apanhador covarde, que de lobo nada tem. Melhor juntar estas aqui do chão, não é mesmo, rapazes? Algumas, pisoteadas. Outras, provadas e deixadas para trás por não serem doces. As que têm partes podres, é só cortar um pedaço que o resto se aproveita. Na hora da geléia, vai tudo pro mesmo tacho. Meninas, esqueçam tudo o que eu falei. Melhor esperar alguém que chegue aqui em cima.